20/01/2012

OS CÓMICOS 313

CRÓNICA “OS CÓMICOS”                                                                                                                     
PUBLICADA NO DIÁRIO DO SUL DE 16.1.2012
           
FUMAÇAS
           
DECLARAÇÃO DE INTERESSESInformo, a quem possa interessar, que não sou fumador – mas já fui. Durante uns vinte anos da minha vida, fumei cachimbo e, ocasionalmente, charuto. Nunca fumei um cigarro. Durante esse longo período, em que escrevia muito, para Jornais e para a Rádio, criei, dentro da minha cabeça, o mito de que não era capaz de produzir uma só linha de texto sem estar simultaneamente a fumegar... Mas, quando resolvi parar com a fumarada, parei mesmo, de vez. Isso aconteceu quando descobri, espantado e alarmado, que tinha uma alergia ao fumo. Ainda andei uns tempos a roer os pipos dos meus 35 cachimbos, vazios e apagados, até perder o vício. Hoje, as fumaças alheias incomodam-me e chateiam-me.
Esclarecido este ponto, estou à vontade para dizer que a ideia maluca, que corre por aí, sob a forma de ameaça geral, impossibilitando as pessoas de fumar, seja lá onde for, é uma burrice, uma asneirada, uma estupidez, uma parvoíce, um disparate, uma tolice, uma jericada – escolham a designação que preferirem, qualquer delas serve para definir essa ideia, parecida com outras que saem das cabecinhas de alguns dos nossos burocratas mais mentecaptos. É assim: de vez em quando, uns sujeitos que não devem ter muito que fazer, põem os pezinhos em cima das suas secretárias, reclinam-se para trás nos seus cómodos cadeirões, e pensam deste modo: – Ora bem, o que é que eu vou inventar esta tarde, para tramar a vida ao nosso Zé Povinho?... São pessoas doentinhas, há que compreendê-las, coitaditas, têm estes ataques de diarreia mental, e então saem-lhes coisas tão parvas como esta de proibir que se fume, não só nos recintos fechados – hospitais, clínicas, escolas, repartições, salas de espera, tudo locais onde a medida tem lógica, é saudável e inteligente – mas, também, nas praças e nos jardins, nas ruas e nos largos, nas montanhas e nos vales, e, sobretudo, à porta das empresas onde o pessoal vem fumar o seu cigarrinho a meio da manhã e a meio da tarde... Bom, lá que este espectáculo dos grupinhos fumantes encostados às ombreiras das portas é um bocado ridículo, até concordo. Mas, daí a alargar a proibição a recintos tais como restaurantes, discotecas e outros, onde os proprietários gastaram um dinheirão a criar zonas para fumadores, com extractores de fumos e outros equipamentos caros, que lhes foram impostos, ainda não há meia dúzia de anos – alto lá, isso já é entrar, não apenas na intimidade dos vícios das pessoas, mas nos bolsos de quem se meteu nessas despesas, com a crença (pelos vistos ingénua) de que estava a tratar com autoridades sérias e honestas, e não com gente que muda de ideias conforme os ventos, as manias, as modas e as conveniências do momento. Eu já nem quero entrar na discussão do fundamentalismo fanático desta gente, que se julga, a si própria, autorizada pela Providência (se calhar, também pela Previdência) a ter o direito de mandar em tudo, até nos vícios alheios, apresentando-se com ideias pretensamente moralistas e salvíficas! Estas gentes não deviam dedicar-se a fazer leis, deviam dedicar-se a criar novas religiões, que é para isso que têm jeito!... Esta ameaça da proibição total do tabaco é tão idiota que nem devia perder-se tempo com ela. Devia era pegar-se nestes Legisladores-da-Caca e metê-los no Manicómio, se ainda lá houver lugares vagos, tantos são os que já lá estão, embora sejam, mais os que lá deviam estar… Aliás, esta iniciativa nem sequer é lá muito inteligente. Se a intenção é baixar o consumo do tabaco, isso iria resultar na baixa dos lucros fenomenais que o Estado recebe, precisamente, através das vendas dos cigarrinhos – pelo que a medida até se pode considerar, nestes tempos de recessão, como profundamente antipatriótica!... Vocês não vêem isto, ó alminhas salvadoras que nos querem libertar do Pecado da Fumaça? Deixem lá fumar a malta, nos sítios onde isso já está permitido, e não compliquem mais a vida das pessoas! Eu, não-fumador, estou disposto a encabeçar uma manifestação a favor do Fumo Livre – desde que, evidentemente, não vá ninguém a fumar perto de mim…

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